segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Fator econômico se sobrepõe ao clínico na opção pelos partos cesáreos, revela dissertação do Cedeplar

terça-feira, 22 de novembro de 2011, às 9h10
Fonte: http://www.ufmg.br/online/arquivos/021795.shtml

As variáveis clínicas que justificam o parto cesáreo – riscos para o bebê ou para a mãe – não têm prevalecido na escolha desse procedimento, que cada vez mais substitui o parto normal nos hospitais brasileiros. A conclusão é da economista Tabi Thuler Santos, que defendeu recentemente a dissertação Evidências de indução de demanda por parto cesáreo no Brasil. Segundo o estudo, fatores não clínicos, como a renda da parturiente, parecem definir a escolha.

Enquanto a Organização Mundial de Saúde (OMS) considera aceitável o percentual de 15% de cesarianas no total de partos, o Brasil registra atualmente em torno de 85% no setor privado e cerca de 35% nos hospitais públicos. Na base de dados analisada pela pesquisadora – um plano de saúde empresarial do estado de São Paulo, no período de 2004 a 2009 –, as cesarianas ultrapassaram os 90%.

Como na maioria das vezes o médico obstetra recebe maior remuneração na realização de parto cesáreo, Tabi Thuler procurou investigar se a vantagem financeira de um tipo de procedimento para o outro tem importância na decisão do médico por realizar cesariana. Segundo a autora, o trabalho é inédito no país por utilizar arcabouço econométrico. “Embora haja muitos estudos médicos sobre o tema, não há pesquisas com esse viés econômico”, afirma, ao lembrar que o principal limitador para esse tipo de pesquisa é a falta de dados. “Minha dissertação só foi possível porque um plano de saúde abriu, pela primeira vez, seu banco de dados para o grupo de pesquisa da minha orientadora, professora Mônica Viegas Andrade”, diz.

O trabalho de Tabi Thuler avalia, por meio de modelo empírico de regressão logística, o impacto do diferencial de remuneração do médico sobre a probabilidade de o parto ser cesáreo. “Como não existem informações sobre os valores recebidos pelos médicos analisados, a estratégia utilizada foi a construção de uma proxy, ou aproximação”, comenta a pesquisadora. Um dos resultados da pesquisa é que a demanda induzida cresce com o aumento do diferencial de remuneração entre os dois tipos de parto.

Traço cultural
“O médico detém mais informações sobre a situação do que o paciente, por isso pode induzir escolhas”, lembra a economista. Tal poder de indução se amplia com a prática – específica do Brasil, segundo ela – de a mulher preferir o parto com o obstetra que a acompanhou no pré-natal.

Outro traço cultural que influencia na escolha, de acordo com Tabi Thuler, é a crença de que o parto cesáreo tem resultado melhor para a saúde. “A ideia é que, por ser um procedimento cirúrgico, o médico teria maior controle sobre a situação, o que traria melhor resultado para a mãe e para o bebê, mas isso não é verdade”, diz ela. Artigos e estudos demonstram que, ao contrário, cesarianas aumentam o uso de anti-inflamatórios pós-parto, o tempo do bebê na incubadora e até as taxas de mortalidade.

Com relação às variáveis que se mostraram importantes na escolha, o estudo apontou a renda da parturiente; o diferencial de remuneração, ou seja, quanto maior a remuneração da cesariana perante o parto normal, maior a probabilidade de o parto ser cesáreo; e o fato de o hospital estar em uma capital, o que pode estar relacionado à complexidade da instituição ou à urbanização, mas o estudo não teve elementos para esclarecer o fato.

Mais estudos
Aumentar o valor pago pelo parto normal ou remunerar por hora de trabalho não parece ser a solução, pois poderia gerar problema contrário, nos casos em que a mulher de fato precise da cesariana, e o obstetra opte pelo procedimento mais caro. Além disso, nem sempre há uma relação direta entre remuneração e escolha do método a ser adotado. “Há outros motivos, como o custo de oportunidade, isto é, enquanto realiza o parto, o médico abre mão de fazer outras coisas, como uma consulta ou até mesmo descansar. E o parto normal tende a ser mais longo”, exemplifica a pesquisadora.

Outro incentivo às cesarianas é o fato de poderem ser agendadas, o que exclui imprevistos como o atendimento em finais de semana e de madrugada. “Tentamos verificar se tendem a aumentar em períodos como final e meio do ano, mas não conseguimos comprovar tal relação”, diz a economista.

Ruim para o Sistema Único de Saúde (SUS) e para os planos privados por elevar os custos hospitalares, bem como para pacientes, por aumentar desnecessariamente os riscos, o número exagerado de partos cesáreos ainda precisa ser objeto de outros estudos, afirma Tabi Thuler. “Este estudo propiciará a realização de novas pesquisas”, diz a economista.

(Boletim UFMG, edição 1758)

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