Especialistas garantem que quanto menor a
intervenção, menores também os riscos para a mãe e para o bebê.
O risco de uma mulher morrer em consequência ou durante o
parto de cesariana é quase quatro vezes maior que no caso de parto normal.
Campeão mundial em cesáreas – a técnica representa cerca de 70% dos partos
ocorridos no país –, o Brasil poderia reduzir os altos índices de mortalidade
materna apenas adotando medidas que dispensam ou requerem o mínimo de
intervenção cirúrgica para se dar à luz. Nessa nova postura preventiva, as
vantagens do parto humanizado ganham cada vez mais espaço entre profissionais e
gestantes.
Os dados são alarmantes. De acordo com a Organização
Mundial da Saúde (OMS), 600 mil mulheres morrem por ano em todo o mundo em
decorrência do parto – uma a cada minuto. Apesar dos esforços, no Paraná a
média ainda preocupa. De janeiro a 21 de setembro do ano passado, houve
101.543 nascimentos e 41 mulheres morreram, perfazendo um índice de 40,4 mortes
por 100 mil nascimentos, o dobro do índice considerado aceitável. Até o ano
passado, a proporção era de 54,6.
Segundo especialistas, esse panorama é resultado da
cultura “hospitalocêntrica” copiada do modelo norte-americano. “Médicos e
gestantes, influenciados pela ideia de maior produção em menos tempo, se
convenceram de que o mais prático é marcar a hora do parto, contrariando a
própria natureza da mulher”, aponta o obstetra e ginecologista Lucas Barbosa
da Silva, coordenador do serviço de obstetrícia do Hospital Sofia Feldman, de
Belo Horizonte (MG).
As altas taxas de cesarianas, avalia o médico, não
condizem com a realidade econômica brasileira. Em países desenvolvidos,
privilegiam-se os procedimentos normais, comprovadamente mais eficientes e
menos perigosos tanto para a mãe quanto para o filho. “Mesmo em Cuba,
economicamente ainda com muitas deficiências, a mortalidade materna não passa
de 25 para cada 100 mil nascidos vivos, resultado direto da preferência pelos
partos normais, usados em cerca de 70% dos nascimentos”, explica.
Defensor da humanização, o obstetra lembra que o
Ministério da Saúde vem adotando uma série de medidas a fim de garantir
melhores condições às gestantes e recém-nascidos. Uma das exigências para as
novas maternidades ou para aquelas que passem por reformas é a de separar a
área de parto da enfermaria normal e a adoção do conceito PPP (procedimentos de
pré-parto, parto e pós-parto no mesmo local e cama, sem que a paciente precise
ser deslocada para outro ambiente).
A preocupação com essa realidade faz parte dos compromissos
do Paraná assumidos no Pacto Nacional de Redução da Mortalidade Materna e
nos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. No entanto, as taxas de
mortalidade ainda caem a passos lentos: 2% ao ano, um terço do necessário para
que o estado chegue à marca de 39 mortes/100 mil nascimentos. Segundo análise
do Observatório Regional de Indicadores de Sustentabilidade (Orbis), esta é a
única das 11 metas que não será atingida em 2010 e nem em 2015.
Epidemia silenciosa
Em 20 anos, desde a instalação do Comitê Estadual de
Prevenção da Mortalidade Materna e Infantil, foram registrados e investigados
2.667 óbitos de gestantes em função do parto no estado. Dessas, 83% poderiam
ser evitadas. As maiores vítimas são mulheres com idade entre 28 e 35 anos, com
dois ou três filhos. Nesse tempo, 5.524 crianças ficaram sem mães. “Estamos
diante de uma epidemia silenciosa que poderia ser evitada com medidas simples”,
revela a presidente do comitê, Eliana Carzino.
Pré-natal de qualidade e a presença do acompanhante são
algumas das alternativas que otimizariam a redução da mortalidade. “Várias
portarias, decretos e leis estão sendo editados para que o sistema seja
reorganizado e mais humanizado. As mulheres precisam conhecer e exigir os seus
direitos”, orienta. A avaliação dos casos, garante, tem papel essencial na
elaboração de ações efetivas para que situações semelhantes não se repitam. O
programa “Nascer no Paraná”, lançado em maio, tem envolvido a comunidade nesse
controle.
* * * * *
“O parto foi rápido e sem dor”
Grande parte das mulheres sem qualquer problema durante a
gravidez e que poderia dar à luz pelo método natural opta pela cesariana por
causa da dor do parto. Temerosas de que o trabalho de parto possa durar horas
e a fim de evitar o sofrimento prolongado, submetem-se à intervenção cirúrgica
por considerarem mais cômodo. Na contramão dos avanços tecnológicos, uma
técnica simples vem ganhando cada vez mais espaço entre profissionais de
saúde e gestantes: o parto na água.
A técnica proporciona maior bem-estar durante o trabalho
de parto pelo efeito anestésico da água morna. Na banheira, as mães ficam mais
relaxadas e as dores das contrações são amenizadas. Em alguns casos, o pai
também pode entrar na água. “Muitas mulheres que optam pelo parto normal
acabam tendo de fazer a cesariana por exaustão provocada pelas fortes dores.
Com o parto na água, as dores são mínimas”, explica a ginecologista e
obstetra Gláucia Menezes, do Hospital Costa Cavalcanti, em Foz do Iguaçu.
Adaptando-se às novas exigências do Ministério da Saúde,
o hospital é um dos primeiros no estado a oferecer a técnica às gestantes. Em
21 de dezembro, a equipe do Costa Cavalcanti realizou os três primeiros
partos na água, todos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Lucas Vinicius Rios da
Silva, terceiro filho de Maria Candelária Rios Irazábal, foi quem inaugurou a
banheira. “O parto foi rápido e sem dor. Não senti quase nada, bem diferente
dos dois primeiros, também normais. Recomendo”, afirma a mãe.
Uma das primeiras maternidades brasileiras a adotar o
modelo humanista no acompanhamento de gestantes e recém-nascidos, o Hospital
Sofia Feldman, em Belo Horizonte (MG), há anos vem conseguindo manter o índice
de cesarianas em 20%. Tudo graças a campanhas de esclarecimento sobre as
vantagens do parto normal, o acompanhamento pré-natal e a multidisciplinaridade
das equipes de saúde, com psicólogo, enfermeira obstetra e “doulas”,
acompanhantes de parto que já tiveram vários filhos.
“A preparação psicológica é muito importante para que a
mãe, quando possível, possa tomar a melhor decisão sobre o tipo de parto que
deseja”, sugere o obstetra do Sofia Feldman Lucas Barbosa da Silva. Técnicas
que auxiliem no trabalho de parto, reduzindo a dor ou possibilitando que o pai
possa estar presente, também são bastante utilizadas na proposta de humanização
do atendimento à futura mãe. Entre as mais procuradas está a do parto na água,
com mais de mil nascimentos desde 2001.
Tipos de parto
Existem basicamente duas variedades de parto – normal e
cesariana – e, dentro deles, outras modalidades, com suas vantagens e
recomendações. A melhor escolha sempre dependerá das orientações do médico,
baseadas nas informações colhidas durante o acompanhamento pré-natal e das
condições da gestante e do bebê na hora do nascimento
Parto normal (vaginal)
Forma convencional de dar à luz.
Anestesias como a peridural e a raquidiana aliviam as dores e não impedem que a
mãe participe ativamente do processo. Evita hematomas, dores pélvicas e
infecções, além de exigir menos tempo de recuperação. Em 24 horas a mãe pode
deixar o hospital.
Parto natural
Nesse procedimento, a mulher é quem faz o
bebê nascer, da forma mais natural possível. Bastante semelhante ao parto
normal, mas sem a utilização de anestesia ou qualquer tipo de indução que
estimule o nascimento. Tempo de recuperação mínimo.
Parto cesárea (cesariana)
Intervenção cirúrgica
recomendada apenas para casos específicos como dificuldade do feto para nascer,
posição invertida ou tamanho desproporcional do feto e hipertensão ou diabetes
materna. Como em qualquer cirurgia, os riscos são maiores. São usadas as
anestesias raquidiana ou peridural e, em alguns casos, a geral. É o parto com
recuperação mais difícil, lenta e dolorida. A paciente só recebe alta depois de
48 horas.
Parto “sem dor”
Conjunto de técnicas que auxiliam a
gestante a identificar o momento certo do parto e a relaxar e se concentrar controlando
a respiração. Utiliza anestesia raquidiana ou peridural para diminuir a dor
das contrações sem que ela seja totalmente inibida, e assim evitar que a mulher
perca a sensibilidade e o controle sobre o parto.
Parto de cócoras (das índias)
Oferece a mesma vantagem de
recuperação do parto normal. Difere-se pela posição da mãe na hora do
nascimento. Mais rápido e confortável, a posição de cócoras aumenta a abertura
da pelve, facilitando a passagem do bebê. Reduz também a incidência de
depressão pós-parto e de dificuldades com a amamentação. No Brasil, teve como
importantes incentivadores os paranaenses Moysés Paciornik e seu filho
Cláudio, que pesquisaram nas aldeias do estado o método utilizado pelas índias.
Parto a fórceps
Utilizado apenas em casos de emergência
ou de sofrimento do bebê com o auxílio do fórceps. O instrumento funciona como
uma pinça especial, com as extremidades em forma de colher para prender e puxar
de forma adequada a cabeça do bebê na saída do útero, no parto normal.
Parto na água
Feito em uma banheira com água na
temperatura do corpo (37°C). Como no parto de cócoras, permite a presença de um
acompanhante. A água morna aumenta a irrigação sanguínea, diminui a pressão
arterial e ajuda a relaxar toda a musculatura, aliviando as dores e agilizando
o trabalho de parto. A água também facilita a dilatação do colo do útero.
Apesar das vantagens, não é recomendado para os prematuros ou em casos de
sofrimento fetal e sangramento excessivo.
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