sexta-feira, 31 de maio de 2013

Nos tornamos cegos para os riscos de ter filhos por cesariana



Os hospitais prestam a assistência médica e tratamento necessários para mulheres que se deparam com dificuldades no parto. Mas muitas mulheres e bebês têm a intervenção médica sem uma boa razão. Nós nos tornamos cegos para os riscos de algumas intervenções comumente utilizadas e a importância do parto natural para um bom começo de vida. Nós nos tornamos cegos para os riscos de ter filhos por cesariana.

Em vez disso, somos cada vez mais levados a acreditar que só é seguro para dar à luz em um hospital e rodeada por médicos.

A cada ano, menos da metade das mulheres grávidas no Reino Unido conseguem ter um parto natural, sem intervenções. E apenas 42% dos nascimentos na Inglaterra e Escócia acontecem sem uma indução, anestesia peridural, raquidiana ou assistido por fórceps ou ventosa (extração a vácuo). Um quarto dos bebês nascidos no Reino Unido são nascidos por cesárea.

No Brasil o cenário é ainda pior, a taxa de cesárea no Brasil é a maior do mundo, 44%. A Organização Mundial da Saúde estabelece que apenas 15% dos partos podem ser operatórios. Os partos vaginais são recheados de intervenções e os partos naturais no Brasil são minoria.

São estes níveis de intervenção justificáveis? Há grandes variações no número de intervenções entre os diferentes hospitais na Inglaterra, o que sugere que nem todos estes podem sempre justificados pela necessidade clínica ou demográfica.

Intervenções aparentemente inócuas, como por exemplo o clampeamento do cordão umbilical imediatamente após o nascimento, as quais eram realizadas rotineiramente são agora comprovadamente prejudiciais. Há evidências de que atrasar clampeamento do cordão umbilical pode prevenir a deficiência de ferro e melhorar o desenvolvimento a longo prazo do bebê.

Intervenções médicas, sobretudo cesarianas, também carregam riscos significativos. Para a mãe os riscos incluem hemorragia, infecção, embolia e trombose. Para o bebê, pode levar a dificuldades respiratórias, problemas pulmonares, prematuridade causada pela operação que está sendo realizada cedo demais e dificuldade com a ligação e amamentação.

Outros problemas podem ser fatais para a mãe e o bebê em gestações subseqüentes. Recentemente, foi relatado que um número significativo de cesarianas eletivas estão previstas, sem uma necessidade médica, e, ainda mais preocupante, realizado antes das 39 semanas, apesar das evidências de que um bebê pode não estar pronto para a vida fora do útero antes dessa idade gestacional.

Nascimento em 37-38 semanas pode significar pior saúde a longo prazo e os resultados do desenvolvimento, tais como problemas respiratórios graves, por esses bebês do que para aquelas realizadas após as 39 semanas.

Na maioria dos casos, o parto natural é a maneira mais segura e saudável de ter filhos e, por isso, deve ser estimulado por meio de uma assistência humanizada, segura e de qualidade. A cesárea deve ser uma opção somente quando o parto normal ou natural oferecer risco de vida ao bebê e à gestante, que precisa ser informada sobre as razões que a impedem de optar pelo parto normal.


Por que as taxas de intervenções são tão altas?

Há muitas explicações - e muitas mais perguntas - sobre por que temos esses altos níveis de intervenção.

Os profissionais inclinam-se para abordagens médicas, porque eles não sabem ou não aceitam a evidência do equilíbrio, ou seja, o balanço entre os benefícios e os riscos de intervenções. Isso seria um reflexo da fé de uma sociedade em tecnologia e tratamento médico, uma perda das habilidades na obstetrícia, da confiança e da autonomia, ou é a dificuldade em reunir e interpretar as evidências sobre temas complexos que são confundidos por muitos fatores diferentes?

É claro que precisamos de chegar a um equilíbrio mais sensato. Uma intervenção muitas vezes leva a outra. A mulher que teve uma cesariana é mais provável que precise de uma repetição do que aquela que teve um primeiro parto normal. A indução do trabalho de parto é mais susceptível de conduzir a cesariana do que aquela mulher que entrou em trabalho de parto espontâneo e uma epidural aumenta a necessidade de parto instrumental e da necessidade de cesariana. A monitorização contínua do coração do feto em trabalho de parto é mais susceptível de conduzir a uma cesariana em gestações de baixo risco, sem evidências de que isso leva a uma melhor saúde para o bebê.

Mas, na realidade, não são as mulheres que estão empurrando os níveis crescentes de intervenção. Escolher ter um parto natural nem sempre é fácil, especialmente quando os serviços de saúde não as orientam corretamente. É comum ver relatos de médicos e parteiras que "burlam" as mulheres e as induzem a fazer o que não querem para eles e para seus bebês. Esse é, talvez, um indicador da diferença entre a política e a prática em algumas circunstâncias. Suporte para parto normal e evitar intervenções desnecessárias agora é visto por muitos como uma questão de direitos humanos.

Existem muitas evidências de estudos internacionais demonstrando que o cuidado liderado por parteiras, sem o envolvimento médico - a menos que seja necessário - leva a um aumento na taxa de parto normal, a redução nas grandes intervenções e mais satisfação relatadas no atendimento.


Um grande estudo recente comparou o cuidado da parteira em diferentes contextos, tais como partos domiciliares ou centros de parto do hospital com cuidados obstétricos (médicos) em gestações de baixo risco, na Inglaterra. Os resultados demonstraram que as mulheres com gestações não complicadas que planejam o seu nascimento com cuidado de uma parteira têm menos intervenções e o parto ocorre de maneira igualmente segura. Os resultados suportam a política de oferecer às mulheres saudáveis, a escolha do local para dar à luz.

No entanto, o cuidado por parteiras está disponível apenas para uma pequena proporção de mulheres no Reino Unido e um número ainda menor para as mulheres brasileiras. Para aumentar o número de partos normais é preciso ampliar o acesso às parteiras e informações de alta qualidade e oferecer verdadeiramente o direito de escolha do local de nascimento do bebê, para as gestantes de baixo risco. Precisamos também de assegurar o apoio pessoal adequado (como o acompanhamento de uma doula, por exemplo) e o uso de intervenções somente quando necessário, garantindo às mulheres que precisam de cuidados médicos que elas tenham a atenção médica de que necessitam.

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