Para saber as diferenças, o primeiro passo é recuperar seu sentido literal, conforme aparece no dicionário. Vejamos o que diz o Aurélio.
Normal: 1) Que é segundo a norma. 2) Habitual, natural.
Natural: 1) De, ou referente à natureza. 2) Em que não há trabalho ou intervenção do homem. 3) Que segue a ordem regular das coisas; lógico. 4) Inato, ingênito, congênito. 5) Próprio do instinto, instintivo. 6) Próprio, peculiar. 7) Não estudado ou calculado; sem artifício; desafetado, espontâneo. 8) Provável, presumível.
A palavra normal vem de norma. É importante entendermos o que é norma.
Norma: 1) Aquilo que se estabelece como base ou medida para a realização ou avaliação de algo. 2) Princípio, preceito. 3) Modelo, padrão. 4) Filos. Tipo concreto ou fórmula abstrata do que deve ser, em tudo o que admite um juízo de valor.
Resumindo: existe na norma que dá vida à normalidade um modelo, um padrão, um modo de ser baseado em princípios e preceitos ou, filosoficamente, numa fórmula abstrata do que deve ser. O normal está vinculado à realização do padrão, criado na base de uma fórmula a respeito do dever ser.
Um modo de ser, um comportamento, uma atitude, assumidos e incorporados pela maioria e repetidos durante muito tempo se tornam habituais, viram uma espécie de reflexo automático e só então são passíveis de serem chamados naturais. Nesse caso, natural significa não-consciente. O que achamos que é normal não é objeto de nosso pensamento, não nos perguntamos cada vez se queremos ou não, está em nossos mecanismos automáticos de comportamento semi ou totalmente inconscientes. O normal vira natural porque passou a ser habitual, ou seja: não questionado, não refletido, não pensado e indagado. Inconsciente.
E como fica isso tudo em relação ao nosso parto normal?
O que é um parto normal hoje?
Em primeiro lugar, o parto normal é o contrário de cesárea. Portanto é um parto vaginal.
Mas, como é a norma desse parto vaginal normal? É um parto hospitalar, é um parto em que a mulher está deitada, com as pernas presas nos estribos e os braços soltos para a mulher poder puxar o guidão (obs: No caso da cesárea, os braços também são presos de lado e amarrados, como se estivesse numa cruz...).
Com certeza isso tudo é normal, pois estamos acostumadíssimos a ver esse tipo de cena (nas maternidades, nos filmes, nos livros), tão acostumados que na maior parte das vezes sequer nos perguntamos se realmente é normal. Mas aí entra a importância de diferenciarmos as palavras. Este parto é normal no sentido de que é o modo como acontece o parto há séculos. Está baseado num modelo estabelecido por volta de 1700 quando as mulheres, alienadas do processo, foram assumindo a posição deitada (decúbito dorsal) para facilitar a intervenção do interventor: o médico. Esse modelo de parto pertence a um dever ser, a um como deve ser formulado abstratamente na base das necessidades do médico. Sendo assim, o sujeito desse parto é o médico.
O nosso atual parto normal não é um modelo de parto comprometido com a idéia de que o parto seja um processo fisiológico natural. Por seguir uma norma construída não na base do corpo, mas de outros fatores, na verdade já não é mais natural.
Por quê? Porque o natural é espontâneo, é instintivo, é aquilo que segue a ordem natural das coisas. Nada que seja socialmente e culturalmente normatizado é natural e o natural não pode seguir um padrão, pois perde inevitavelmente seu sentido e sua essência. Portanto não é possível estabelecer um padrão para o parto. Da mesma forma diríamos que não se pode (e não se deve!) estabelecer um padrão para uma relação sexual: quanto mais natural, espontânea e vivida melhor; quanto menos cerebral, quanto menos preocupada em atender modelos e normas, melhor. Caso contrário será um fracasso.
Quando falamos em resgatar o parto como processo fisiológico, o parto como sendo da mulher, estamos na verdade resgatando o sentido íntimo de um processo vinculado aos instintos e ao corpo: ou seja, de um processo que é fundamentalmente natural.
Natural é entendido aqui como aquilo em que não há trabalho ou intervenção do homem, a menos que seja estritamente necessário. O natural do parto é permitir que as coisas sigam seu curso, é quando não há artifícios, intervenções desnecessárias. Pois a natureza segue um curso, tem um processo, tem um sentido, um começo e um fim. A natureza é ordeira, é sensata, é finalizada. Natural não é louco, caótico, insensato. O amparo humano está em permanecer alerta para possíveis erros da natureza. Mas, lembrem-se que os humanos erram também e muito! Que se por um lado temos a vasta gama de conhecimentos científicos e tecnológicos, por outro temos milhares e milhares de anos de prática natural da natureza... a assim chamada sabedoria da natureza.
Sendo animais racionais, mas ainda assim animais, é sensato e sábio da parte nossa, mantermo-nos bem integrados e estáveis nos dois mundos: o natural, o que segue a natureza, o fluxo e a sabedoria da natureza pois ela tem ainda muito para nos ensinar e o racional, que tem conhecimentos mas também sabe refletir criticamente sobre os mesmos.
E você, teve ou vai ter um parto normal ou natural?
por Adriana Tanese Nogueira
fonte: http://www.amigasdoparto.com.br/normal.html
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